Depois de todos esses anos, o resultado
é aquilo de que não me lembro. Os vazios são justiceiros implacáveis, perseguem
as criações inconclusas, o que se deixou para trás. Os vazios perseguem como
uma noite que nunca amanhece. Por isso faremos uma nova escritura sobre tudo o
que foi esquecido, sobre o flagelo da memória. Só não sabemos como fazer. Não sabemos
como olhar e ver o que se move no vão das coisas. Saímos por aí, tecnológicos e
inquietos, em busca de palavras, como peregrinos, vagando, atravessando
distâncias, empilhando tijolos e papéis. Os intervalos são a nova linguagem. As
fissuras, os interstícios. E pensar que, quando crianças, nós nos escondíamos
no vão das coisas. Lá está a voz que se constrói e se desmorona. Se alguém a
capturar, essa pode ser uma boa história. Por isso, vamos lembrar, uma vez mais:
interlúdios, intervalos. Ainda não sabemos como ressuscitar subgêneros; o que foi
esquecido é um novo mundo dos mortos.
FERNÃO GOMES
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