quinta-feira, 12 de agosto de 2010

ZEITGEIST

No baile de máscaras os pássaros translúcidos apareceram, repentinamente. Revoaram, em silêncio, descrevendo trajetos irregulares sobre os convidados que os observavam, também em silêncio. Sua presença causou entontecimentos e enjoos nas mulheres e deixou um silvo agudo, quase imperceptível, na sensibilidade confusa dos homens. Os mordomos e as camareiras, que não foram afetados pela aparição daquelas criaturas espectrais, distribuíram calmantes, analgésicos e anti-espasmódicos para os mascarados à beira de surtos de histeria e medo. Passado o mal-estar, que os amontoou sofregamente em filas desordenadas às portas dos banheiros, retornaram à diversão. Aos poucos, ao som da música hipnótica, foram ocupando seus lugares no salão e, minutos depois, estavam completamente entregues aos delírios de seu hedonismo incurável.



P.S.: Durante a aparição das criaturas espectrais, os mascarados, extáticos, nem se deram conta de que um dos convidados, apenas um, horrorizado com o que presenciava, deixou o recinto aos gritos e lançou-se janela afora, consumindo-se naquele precipício íngreme e profundo.



FERNÃO GOMES

Um comentário:

  1. Suntosos os tecidos que me velam os olhos,
    Com carinhos maternos, sutis.
    Num momento em que a máscara,
    Já não mais impede a passagem de imagens de torpor.
    (quanto mais aproximo o eu-rosto maior o ângulo de visão)
    Epifanias (enteógenas) despertam,
    Determinam o pathos
    As pálpebras, já não mais garantem opção.

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