quarta-feira, 15 de setembro de 2010

PARA SEMPRE

Eu estava de joelhos diante do grande altar, quando senti um tremor em meu coração. Cobri-me com o capuz e fiquei quieto, esperando por uma oscilação tênue no ar rarefeito. Súbito, aquele perfume ultra-azul, hipnótico como as flores de Havona, instalou-se nos vazios da catedral: “É estranho o sentimento de revolta que toma posse de meu coração, toda vez que nos encontramos.” Levantei-me e, ao contemplá-la de frente, confesso que fiz um esforço tremendo para não cair outra vez aos seus pés, seduzido por aquela imaterialidade elétrica que parecia esplender-se em todas as direções, mas inexplicavelmente contida por uma transmecânica que tornava possível envolvê-la em meus braços, durante séculos. “São defesas forjadas por mim mesma, eu sei. Eu te amo. Mas não posso; simplesmente não posso.” Era um fim de tarde e eu fiquei parado, sozinho entre as capelas radiantes, transido na fronteira dos vazios extensos que se abriam monstruosos diante de mim. Ela desapareceu, dissolvendo-se entre os arcos ogivais da grande nave, não sei como fez aquilo. Mas deixou em meus lábios um chamado, um sinal inscrito em mim mesmo, uma distinção que há muito ela também leva consigo.   


FERNÃO GOMES

2 comentários:

  1. Sua descrição se parece um dos ambientes de uma obra minha. Fantástico.

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  2. Olá professor! Realmente você viaja muito nas histórias!O que eu adoro! Muito bom os textos, e claro, muito bem escritos.Abraço! Maiara (Pandora)

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