sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

A PASSAGEM DO MOÇO

Olá, pessoal. Como vocês estão? A partir de hoje, retomo as postagens do ZONA, a fim de concluir o projeto literário referido no post anterior. Antes, porém, gostaria de informar que aceitei, como sugestão de título para o último texto publicado, a ideia do velho amigo Santiago: "A passagem do moço". Agradeço aos demais amigos e conhecidos que participaram do pequeno desafio, pois sua atuação foi sinceramente incrível. Além daqueles que fizeram propostas no próprio blog, outros preferiram participar através de emails. Alguns fizeram sugestões pessoalmente, timidamente, que me divertiram e me comoveram. Muito obrigado a todos, indistintamente. Sua participação (e presença!) é indispensável. Como combinamos, publico, outra vez, o texto anterior, mas agora com o título que lhe pertence, porque está completo. Boa leitura. Abraços. 


 Muito tempo se passara desde que ele tivera de deixar o país. Lembrava-se perfeitamente de toda a família, de todos aqueles com quem convivera, dos rostos de cada um deles: conservara-os em si com um realismo vívido só comparável, como ele próprio dizia, aos pintores holandeses do século XVII. Compusera quadros com ruínas de seu passado; sobrevivera aos anos de exílio em nome dessas imagens; suportara as lacerações da distância e da solidão, recriando, dia a dia, a nitidez de cada olhar, de cada sorriso, urdidos no fluir caudaloso dos anos. Mas os tempos de militarismos latino-americanos e suas ferocidades foram aplacados e deram lugar a outras composições sociais que o trouxeram de volta à terra onde nascera. No aeroporto, antes de embarcar, comprou brinquedos ao sobrinho, com quem passara ludicamente os últimos dias daqueles anos. Ao encontrá-lo, viu diante de si um rapaz de dezoito anos, que o recebeu amavelmente, acompanhado de sua namorada. Ele ficou parado, em silêncio, segurando os brinquedos que acabara de comprar, enquanto sentia as lágrimas escorrerem pelo rosto.

FERNÃO GOMES  

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