domingo, 31 de julho de 2011

X-FILES

Ele pôs o fone de ouvido, mas não conseguiu ouvir New York, New York. Talvez o aparelho estivesse com defeito. Chamou o operador de áudio e, num inglês sofrível, explicou o problema. O rapaz fez ajustes em alguns botões e o devolveu em perfeito estado de funcionamento. Enquanto ouvia a canção, cobriu a cabeça com o capuz, como tinham feito os demais monges que ali aguardavam o momento da gravação do comercial. Estavam sentados na posição de lótus, ouvindo nos fones a voz de Frank Sinatra. Percorreu com o olhar as câmeras e os holofotes dispostos em todos os cantos do grande terraço, de onde era possível contemplar a Ilha de Manhattan, naquele fim de tarde frio e sem nuvens. A numerosa equipe da emissora movimentava-se, de um lado a outro, dispondo os últimos microfones, realizando testes. Logo, o diretor fez um sinal, interromperam a música, ficaram todos em silêncio. Depois da contagem regressiva, entraram ao vivo na programação da emissora. Ao sinal do assistente, os monges iniciaram a vocalização do OM, em tom grave e vigoroso. Aos poucos, sua vibração começou a estremecer as instalações de transmissão, explodiram alguns holofotes, romperam-se fios elétricos e, um a um, os monges elevaram-se no ar e, diante dos olhos de milhares de pessoas, desapareceram na última luz do dia.

FERNÃO GOMES

Um comentário:

  1. Tais ideias de sumiço e reaparecimento em outros locais que nem sabemos onde me deixam desconfortavelmente confortável: o choque pelo desconhecido, mas o aconchego pela possibilidade da novidade.

    E por aí, tudo está bem?

    Abraço.

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